Outro dia, eu estava voltando do trabalho, de bicicleta, quando quase atropelei uma cobra. Levei um susto, claro - se você não mora no Acre, uma cobra na ciclovia é um evento digno de nota. Parei para ver melhor.
Um cara tentava empurrá-la para fora da pista, usando uma folha comprida de alguma planta. Sem sucesso. A folha era mole e a cobra - uma jiboia filhote - desviava por um lado e pelo outro, irritada, a boca aberta, o bote pronto.
Repare que, embora eu tenha dito "jiboia filhote", não tenho a menor ideia do tempo de vida de uma jiboia nem de quanto tempo ela demora para crescer. Só sei que aquela era menor que as outras que eu já tinha visto (não muitas, confesso, e nenhuma em ciclovias). Tinha uns três palmos de comprimento e a grossura de um dedo.
Vendo o cara atrapalhado, me aproximei e comentei que, com aquela folha, não ia dar. Interessante que eu estava absolutamente certo, mas não tinha nenhuma solução melhor para oferecer. Teria futuro como consultor.
Tentamos usar a tranca da bicicleta, nossas camisas e outros objetos, mas só conseguimos irritar mais a cobra e quase sermos atropelados por outras bicicletas. Ficamos eu e o cara olhando para a jiboia - agora, encastelada no meio da pista, defendendo terreno. Então, lembrei de uma história que meu tio havia me contado, mais de trinta anos antes. Ele disse que dava para pegar uma cobra pelo rabo, se ela não fosse muito grande, pois a cobra só conseguia dar um bote de no máximo 1/3 do seu tamanho. Teria aprendido isso no Exército.
À medida em que os anos passaram, sempre que eu lembrava desse relato, mais e mais achava que esse 1/3 era um número chutado, sem nenhum respaldo científico. Ou que era pura lenda. Mas a coisa ainda me intrigava.
Bom, ali estava a cobra e ela tinha um rabo. Eu jamais arriscaria com uma jararaca, ou algo assim, mas jiboia não tem veneno. No máximo, eu ganharia uma dentada e um esporro, quando chegasse em casa. Cerquei por um lado, cerquei por outro e... pá! Agarrei-a pela ponta do rabo, mantendo o braço esticado, bem longe.
Funcionou. Ela se contorcia, olhava para cima, mas não me alcançava. Rindo igual uma criança, fui até uma árvore grande, coberta de trepadeiras, e coloquei ela lá. Eu e o cara trocamos mais algumas rápidas palavras, rindo, e seguimos, cada um para um lado.
Pedalei a volta toda com um sorriso. Mal podia esperar para contar para Luana. Cheguei em casa exultante. Encontrei-a cozinhando.
- Amor! Você não vai acreditar no que me aconteceu!
Ela me olhou por cima do ombro, sem parar de mexer na panela. Continuei:
- Tinha uma cobra no meio da ciclovia! - ela me olhou com cara de pouca fé, sem dizer nada. - É sério, amor! Uma jiboia pequenina! Peguei ela pelo rabo!
Sem mudar a expressão, ela perguntou:
- Você lavou essa mão?
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